13.6.08

Copo de água em Monsul

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Depois de já estar familiarizado com as gentes do Norte, fui, algumas vezes, convidado para casamentos de pessoas conhecidas.
Ente eles, houve um onde ocorreu uma cena que não posso deixar de relatar, pois os seus contornos foram engraçadíssimos.
Um casal a viver na margem Sul do Tejo, ele bracarense, ela da terra onde está instalada a Siderurgia Nacional, com um casal de filhos já maiores, também foram convidados, dado serem familiares do noivo e meus amigos.
Nos meses de Verão, são quase sempre escolhidos para a realização de casórios e na igreja do Bom Jesus de Braga, os residentes e os emigrantes que vêm a propósito para o enlace, dão um movimento que mais nenhuma igreja do País consegue igualar. Não faço ideia de quantos casamentos se realizam a um sábado ou domingo naqueles meses, mas garanto-vos que são muitos, muitos mesmo.
O casório em causa, realizou-se na igreja da Madalena, na encosta da Falperra, a poucos quilómetros de Braga e do Bom Jesus e quem estiver num destes sítios para se dirigir a Braga, pode fazê-lo directo ou com passagem pela outra igreja.
No local e antes do seu início, foi distribuída uma folha de papel com um desenho do percurso onde se realizaria o “petisco”, de forma a eliminar dificuldades que alguns tivessem, já que o local era em Monsul – Póvoa de Lanhoso, longe da cidade de Braga, e numa quinta que só poucos conheciam.
O tempo de ausência, aliado ao desenvolvimento das cidades, fê-lo perder a noção exacta dos sítios que, na sua meninice, lhes foram sempre familiares, pelo que lembrei aos recém-vindos para terem cuidado e não se perderem. Sem problemas, disseram-me, dado ser colocado um pouco de tule nas antenas de rádio de todos os carros e, portanto, não era difícil seguir o que ia à frente e, consequentemente, o de trás faria a mesma coisa.
A família Costa, nos dias em que estivessem na Cidade dos Arcebispos, ficavam num apartamento de um sobrinho na Rua Conselheiro Lobato (ali bem pertinho do Estádio 1º de Maio), que estava, como sempre, um brinquinho para receber familiares e convidados.
Quando todo o ritual do casamento católico acabou, os convidados dirigiram-se aos automóveis e partiram a caminho de Monsul. Uns descendo directamente para Braga e outros subindo com passagem pelo Bom Jesus. O Costa seguiu um que subiu e fez o percurso pelo Bom Jesus e aí, com os olhos postos no tule da antena, não se apercebeu de que o perseguido desaparece e ele estava atrás de um outro carro vindo de um outro casamento realizado no Bom Jesus.
O filho varão, com o papel na mão com a indicação do percurso, achava que tudo corria às mil maravilhas, pois a Póvoa de Lanhoso já estava à vista.
Na chegada à quinta onde os convidados iam acamaradar e encher a “pança” à conta dos pais dos nubentes, o Zé já tinha dado pela falta da família Costa e já tinha alertado o seu sobrinho (cedente e dono da casa, onde aqueles ficavam), para a sua falta, resolvendo este voltar atrás para ver se os encontrava.
Entretanto, os Costas chegam à quinta onde se realizava o casamento do carro que o antecedia, dirigem-se ao pavilhão, sentam-se e dá-se início ao repasto. Estranharam não ver ninguém conhecido, mas, naquelas ocasiões, á sempre muito gente e portanto, à vontade, iniciaram a refeição com uma canja de galinha. A filha, alta, calmeirona, levanta-se para dar uma olhadela aos convidados e à mesa de honra, sentando-se imediatamente, diz aos pais:
Vamos embora, estamos enganados o noivo é mulato.
- Nem um mergulho no tanque da quinta era capaz de fazer mais calafrios do que aqueles que sentiram a família Costa.
Na estrada, o sobrinho não os encontrou, na cidade tão pouco, até que resolveu ir a casa e então depara-se com o espectáculo da mãe e filha estarem de volta do frigorífico a tentarem arranjar alguma coisa para comer, o filho sentado a ver televisão e o chefe da família e pai Costa, já em cuecas, a bracejar e a protestar por não ter conseguido desfiar o fio da meada.
A partir daí, uma alma nova voltou e lá partiram todos de novo para o seio daquele casamento, que os fez fazer uma viagem tão longa e faziam tanto gosto de desfrutar com a família.

3.6.08

El Rocio



Peregrinos em pleno Parque Doñana a caminho del Rocio
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Na província de Huelva – Espanha em pleno Parque Natural Doñana e a 15 Km de Matalascañas, existe uma povoação de nome El Rocio.
Povoação de ruas de terra solta de grande movimento de cavalos e a lembrar os filmes do Oeste Americano, pois à frente de todas as casas existem armações de madeira para prender os equídeos.
A terra tem como sua Santa Padroeira a Senhora del Rocio realizando-se a sua festa anual no mês de Maio.
Festa Rocieira, cavalos, charretes, carroças engalanadas, sírios vindos de toda a parte, contribuem para fazer daqueles dias uma romaria de cariz extremamente popular, vendo-se em toda a parte as danças de flamengo, acompanhadas pelos cantos dos romeiros.
É festa e local que aconselho a visitarem, tal a beleza que o conjunto de peregrinos e romeiros nos oferece.
O Zé foi campista e durante muitos anos passava os fins de semana a correr e a frequentar os acampamentos colectivos que se realizavam no país. E foi neste convívio semanal que arranjei grandes amigos e aprendemos a ser desenrascados para resolver todos os problemas que de ocasião nos surgem. Mais tarde, enveredei pelo campismo/comodismo e agora quando me desloco uso o hotel.
Entre os amigos que conheci, havia dois casais (pai, mãe, filho e nora) que aliavam aos conhecimentos da actividade, uma dose de humor invulgar, sendo por isso pessoas de fácil relacionamento para amizade duradoira.
Com grande antecedência combinamos ir ao Santuário del Rocio nos dias da romaria para poder apreciar aquela festa.
O percurso seria feito em 2 viaturas, pois cá o rapazote não dispensava a Silvia, namorada de então.
Metemo-nos a caminho de Vila Real de Santo António, navegámos no rio Guadiana para fazer a travessia e assim que chegamos a Ayamonte. O Jonas (cabeça de casal) na outra viatura, resolveu meter gasolina super no seu “Ford-Balila” de cor castanho claro comprado em 2.ª mão por três contos.
Para vos dar uma ideia da velocidade supersónica que o bólide dava, conto que, por empréstimo utilizei-o numa viagem da lagoa de Albufeira-Sesimbra, até Cacilhas, com uma caracoleta a passear no vidro da frente e sem que o animal caísse do vidro.
Depois de atestado e enquanto houve gasolina normal nos canos a coisa correu bem. O pior foi quando chegou a super ao carburador.
O carrito ou porque já se sentisse em plena romaria no meio da “cavalada” ou a comida não fosse a apropriada para o seu estômago começou a soluçar, até que parou definitivamente.
Todos opinavam, sendo necessário fazer uma assembleia informal para decidirmos o que fazer, recaindo a solução na substituição da gasolina super pela normal na esperança de que fosse esse o causador do mal que afectava o seu bom funcionamento.
Na realidade, confirmou-se a preocupação. Substituímos a “cevada, por palha” de fraca qualidade e o animal até ao “Rocio” jamais parou.
Chegamos ao destino no pino do calor, arranjamos um bom local para montar as tendas, (há quem lhe chame barracas) com a ligeireza e prática adquiridas ao longo dos anos.
O Jonas estende o pano de chão, começa a bater estacas e a Adalberta, sua mulher, entra de gatas dentro da tenda, ainda sem mastros e começa imediatamente a fazer a cama, ficando com o rabo virado para a entrada.
Tudo isto é feito com sincronismo, pelo que o marido, chegada a sua ocasião também entra de gatas para montar os mastros.
Metendo a cabeça dentro da tenda, e sentido um aroma conhecido disse com a maior alegria e inocência:
Que bom Adalberta, trouxeste bacalhau.
Só a gargalhada geral o fez perceber que o cheiro não era do “fiel amigo”.
Mas campista é campista e o Jonas, desembaraçado e solícito, pega num alguidar de plástico e dirige-se aos lavatórios para fazer uma saladas para todos.
A nora bem o chamava; Jonas venha cá, dê cá o alguidar, Jonas venha cá, e ria desalmadamente sem que o sogro fizesse caso do chamamento, acabando para fazer uma salada deliciosa com tomate, alface, e pepino, bem temperada a preceito.
O petisco era de primeira, mas a Adalberta e a nora não tocaram na salada, até que, com esta já quase a acabar o Jonas comenta. Então vocês não tocaram na salada?
A nora com o ar mais divertido deste mundo responde!
É que este alguidar não é o da salada, é da gente se lavar por baixo.
Foi lindo “El Rocio”, a missa, os cantares e devoção dos romeiros, mas o que mais ternamente recordo são as genuínas peripécias do campismo e as suas capacidades de improviso.
A partir daí, o Zé e a Silvia em gamela colectiva e em alguidar de plástico nunca mais comeram salada.