4.12.07

O entulho

Vivi com a família 2 décadas numa cidade do Norte, a garagem da nossa casa necessitava de obras, pelo que resolvi meter mãos à obra, contratando um trolha e servente. Parede daqui, colocação de azulejos, pavimento vidrado e até um tanque de cimento, onde se lavava a roupa foi partido, porquanto não fazia falta.
A partir de certa altura era necessário deitar o entulho fora, que à falta de transporte adequado passou a ser problema.
Meus sogros passavam grandes temporadas em nossa companhia e ajudavam-me sempre que precisasse.
Matutei na maneira de me desfazer de tanto entulho e lembrei-me do seguinte:
A Cidade estava permanentemente em obras de construção com aterros e desaterros em toda a parte, pelo que o problema era de fácil resolução. Procuraria um sítio de aterro onde pudesse deitá-lo. Sabia que não é permitido fazê-lo, mas achei que se ficasse no sítio certo, não viria nenhum mal ao mundo e o construtor até agradecia.
Numa carrinha de 2 lugares, carreguei quanto pude e de noite não fui muito longe; bem perto da minha residência havia o local ideal para o efeito.
Todavia, havia algo com que eu não contava. É que em todos os locais onde fomos havia sempre um carro parado, presumivelmente com um parzinho de namorados. Quando já não sabia o que fazer, deparou-se-nos um local estupendo, à entrada de uma azinhaga que não tinha saída, ali mesmo ao lado duma obra. Fiz marcha-atrás e despejei o entulho logo ali à entrada voltei a casa mais 3 vezes e sucessivamente fui fazendo um monte, que passou a montão e finalmente a castelo. O entulho como já disse, era composto de restos de azulejos e mosaicos vidrados, restos de parede e culminava com os bocados do tanque da roupa agarrados ainda aos ferros que lhe davam forma.
Aí, a coisa pôs-se feia, dado que bem lá no fundo da azinhaga se encontrava um carro que, como todos os outros a que já me referi, estava ali no esfreganço. Para evitar discussão acesa, resolvi pirar-me deixando lá o desgraçado que em marcha-atrás só viu o entulho quando lhe encostou. Faço ideia das pragas que o moço rogou ao filho da mãe que o entalou, enquanto retirava o entulho até ter espaço disponível para sair dali com o carro. E imagino, agora já passados anos, como contará a história aos amigos.
Mas acontece que o Zé do Cão ainda não estava totalmente livre do resto do entulho.
Um mês antes, tinha ido com a família a Tenerife; levámos uma mala de viagem de veludo castanho, por sinal muito bonita, só que os bagageiros não se compadeceram da sua boniteza e trataram de colocá-la no porão do avião, por debaixo de mais 300 malas dos outros passageiros, ocasionando que quando a vi, coitada, estava marreca, tinha falta de ar e com a língua de fora. Enfim estava num estado lastimoso e a língua era uma gravata que já saía das suas entranhas. Logo ali, em pleno Aeroporto “Reina Sofia”, resolvemos comprar outra para sua substituição, coisa que não fizemos, pelo que a desgraçada teve de fazer a viagem de retorno sujeita a dar-lhe a trombose final.
Ela, coitada, ali estava na garagem à espera do abandono que lhe daríamos, dando ais à sua vida e sem saber onde iria parar.
Então resolvi enfiar-lhe todo o resto daquelas matérias que foram primas e, para a fechar, já me vi aflito. Quando a pus em pé, quis mete-la na carrinha, mas não fui capaz.
O seu peso ultrapassava largamente as minhas forças. Chamei o meu sogro que não sabia nada daquilo e pedi-lhe que a metesse na carrinha. Coitado, quase que foi ao chão e ela nem se mexeu.
Para a subir, foi necessário eu, meu sogro e meu filho mais velho, para a retirar, olha, era descair e já estava.
Cerca das 22 da noite, meti-me na viatura com o meu sogro ao lado, inquieto e desejoso de saber qual seria o meu pensamento, que digo de verdade até aquela altura não era nenhum, mas ao passar por uma paragem de autocarro lembrei-me: e se eu a deixasse aqui? Meu dito meu feito, é isso mesmo. Só que em todas as paragens de autocarro sempre havia um passageiro à espera e não era conveniente fazer aquela operação com alguém a mirar.
Acabei por desistir. Dirigi-me a um parque de estacionamento de uma grande superfície. Já havia poucos clientes e o espaço onde estacionam as viaturas já tinha poucos carros. Parei junto a um qualquer, puxei a mala, caiu e ficou em pé junto à porta do condutor, do escolhido, tendo-me colocando em observação afastado, para ver o efeito.
Dali a pouco lá vem um cavalheiro com as chaves do carro na mão e a assobiar, vê a mala ali mesmo à mão, olha para todos os lados, não vê ninguém, abre a bagageira da sua viatura, e pega na mala. Qual quê! O homem tinha lá força para aquilo; faz segunda tentativa com as duas mãos, juntando-a ao peito e quando a metia na bagageira o fecho abriu e aí, amigos, foi coisa linda: o entulho entornou-se parte para dentro, parte para fora e o homem ficou sem pinga de sangue e os sapatos em mísero estado.
Ficou atrapalhado, tendo acabado por colocar a mala também lá dentro, arrancou com tanta força que até os pneus patinaram.
Adorava ouvir a história contada por ele. Quantas pragas também me pregou…
Na realidade, agora, passados vários anos, reconheço que merecia umas arrochadas pelas costas abaixo, não acham?

14 comentários:

Capitão Merda disse...

De facto, Zé, não é serviço que se faça!
Mas ficas desculpado se preparares uns mexilhões para a malta...

Zé do Cão disse...

Apenas confirmo. Garanto que sim e da Galiza.

Anónimo disse...

Ó Zé: Então isso é coisa que se faça? Andar a descarregar entulho na via pública e nos estacionamentos? Eheheh, a coisa até teve a sua (des)graça e olha que se tivesses recorrido aos serviços camarários para o efeito, o mais certo era dizerem que não o faziam. É por isso que o país está cheio de montes de entulho nas bermas da estrada e montes de merda nas Câmaras Municipais (eheheh).
Só foi bem feito para o "caramelo" do estacionamento, que se fosse uma mala valiosa deixada por esquecimento, ele tinha-se afiambrado a ela sem procurar saber de quem era.
Abraços.

Zé do Cão disse...

É tal como dizes, Zé. Só te digo que sempre que venho espreitar os comentários da malta, desato a rir desta aventura.
O meu sogro, que não é nada dádo a estas coisas, fartou-se também de rir.

Olá!! disse...

Hahahaha adorei estas duas histórias... hoje ainda não me tinha rido, obrigada.

Zé do Cão disse...

Olá.
Já li, reli e tornei a ler, e sempre fico com as lagrimas nos olhos de rir. Mas se os gajos me apanhassem naquela altura, esfarrapavam-me todo.
Fica bem e volta sempre.

Estrela da Liberdade disse...

Caro Zé,
Histórias não te faltam, agradeço e retribuo o link finalmente...
Um abraço,
Jean das estrelas

Anónimo disse...

Atão Zé! Ainda não descobriste o caminho para a Rua do Beco? eheheh.
Se carregares com o rato no meu nome, vais ver que chegas lá num instante.
Sabes que às vezes os gajos da blogspot andam a dormir. Ainda ontem tinha o meu blogue todo em inglês (menos aquilo que eu escrevo, como é evidente).
Abraços e bom fim-de-semana.

Olá!! disse...

hahaha eu tb tive o meu em "estrangeiro" ia apagando tudo... só tenho a 4ª classe e não percebia nada...
Boa semana Zé

kuka disse...

Histórias bem dispostas essas.Lol!

Anónimo disse...

Amigo Zé: já vi que andas com pouca vontade de escrever. Passei para informar que o meu blogue passou a estar no Sapo e o novo enderesso é http://semassunto1.blogs.sapo.pt
Faz favor de copiar esta merd* para a barra de endereços eheheh.

Anónimo disse...

Porra, agora é que eu vi que tens a minha morada errada. Aquele endereço que tens na barra lateral está errado. Quem é que te pôs aquilo ali? Aquele endereço era dum blogue que já não existe.
Agora o endereço é o que coloquei no comentário anterior ou então segue o link que lá deixei e vai clicando nos que te vão aparecendo, até encontrares a nova Rua do Beco.
Abraço.

Laura disse...

arrochadas, zé? isso seria um favor dos Deuses! devias ser obrigado a retirar o entulho todo onde o colocaste e barraste a saida de um condutor ehhhhhh, e o homem teve o que merecia, se a maleta nem era dele pra que foi lá meter o bedelho?--bem feita ehhhh. ji a ti demasiado maluco para os tempos actuais ehhhh...

Zé do Cão disse...

Laurinha
Eu pretendia era deixar a mala numa paragem de autocarro. Mas não sei porque carga de água é que havia sempre gente lá.
Quando descemos da estação do comboio para Real, há esquerda estavam a fazer todos aqueles prédios e foi aí que entalei o gajo do carro.
ahahahah....